segunda-feira, 15 de junho de 2009

As pernas da cama

Dom Pedro José Conti, bispo de Macapá

Certa vez um homem adoeceu de uma doença esquisita. Toda noite, quando ia deitar-se, imaginava que de baixo da sua cama estivesse escondido um monstro horrível que ia devorá-lo. Com este pesadelo ele não conseguia dormir de jeito nenhum. Vivia apavorado. Assim começou a procurar uma cura para a sua enfermidade. O primeiro médico lhe prescreveu um potente remédio para dormir. Não deu certo; o medo era mais forte que o remédio. Um outro médico lhe aconselhou um tratamento de acupuntura e um medicamento homeopático caríssimo. Apesar dos gastos, o pesadelo noturno continuava. Por fim os parentes levaram-no para um famoso psicólogo que iniciou uma série de encontros incluindo sofisticadas técnicas hipnóticas. Após a segunda sessão de terapia, porém, o homem nunca mais se apresentou ao médico. Este achou impossível que a cura já estivesse sortida efeito. Ficou curioso e foi atrás do paciente. Quando o encontrou, quis saber o motivo da sua desistência no tratamento. O homem, com toda tranqüilidade, respondeu que uma noite durante a qual o pesadelo era mais forte do que outras vezes, ele, desesperado, tinha procurado o velho pároco da paróquia onde morava. Este lhe disse de serrar as pernas da cama. Com o colchão praticamente no chão o monstro não teria mais onde ficar. Assim o homem fez e o pesadelo nunca mais voltou a importuná-lo. Nada de mais simples e comum. Acredito que, entre muitas outras, esta poderia ser a mensagem das parábolas do Evangelho deste domingo. A primeira nos lembra que a natureza tem o seu curso. Este vale também quando o agricultor dorme. Com efeito, o fato que ele durma ou fique acordado, não muda as leis da natureza. Do mesmo jeito o tamanho da árvore final, não depende da grandeza da semente inicial. Assim acontece com o grão de mostarda, semente minúscula em si, mas capaz de transformar-se em árvore frondosa.Tenho a impressão que estejamos todos pecando por grandiosidade e por orgulho. Estamos desdenhando as coisas e, infelizmente também as pessoas simples, pequenas e humildes. Parece que somente o extraordinário tenha valor.Queremos tudo grande logo. Os eventos devem ser mega. O show só pode ser mega. Assim o sucesso, o negócio, o lucro. Se não for grande, não presta. Desta forma, por não aceitar de não ter nascido logo grandes, parece que estamos desistindo de crescer aos poucos. Falta-nos a paciência de esperar e a humildade de reconhecer as nossas limitações. As crianças querem ser adultas antes do tempo; são estimuladas a imitar os grandes, sobretudo os ídolos do momento. Assim perdem a poesia e a espontaneidade da infância. De tanto copiar os “famosos” correm o perigo de perder a própria originalidade. Outras vezes, os pais querem que os filhos sejam os primeiros em tudo, que ganhem sempre. Nasceram para serem campeões. Obviamente aqueles e aquelas que não o serão correm o risco de ficar frustrados a vida inteira, de sentir-se fracassados e culpados por ter decepcionado os próprios pais. Se tivessem aceitado crescer aos poucos, talvez, teriam chegado mais longe do que pensavam. Sobretudo o teriam feito naturalmente aprendendo a usar bem das suas capacidades, sem mentiras, trambique ou ilusões. Capacidades e qualidades não se compram. São dádivas. Cabe a nós fazê-las crescer cultivando-as. Competência e experiência também se aprendem aos poucos e não sem esforço. Muitos, pela pressa, desistem e ficam medíocres.Na natureza acontece o que Jesus nos pede: começar pequenos, buscando aquela pequena força que nos fará ser grandes. Esta força se chama confiança em nós mesmos e em Deus que nos ama e caminha conosco. Qualquer pequeno passo dado para moldar para melhor o nosso caráter e a nossa personalidade, será o maior sucesso da nossa vida.Para derrotar o pesadelo do sucesso a qualquer custo, basta serrar as pernas do nosso orgulho. Partindo bem de baixo, só poderemos crescer para cima. Fadigosamente sim, mas cresceremos, naturalmente. Ao contrário, se cairmos do alto do nosso trono imaginário, será um verdadeiro desastre.